Júlio Morais, 17


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[sexta-feira, abril 27, 2007]

Hands cover whispers of the lovers' fright
Fear-cloaked renditions of that autumn night
Digging up rumours of the kids in the park
What awful things happened in the dark?
- Lover's End, The Birthday Massacre

Segredo dos Amantes
(by Júlio)

Era noite de novembro de 1579. O salão real estava cheio, todos vestidos a caráter para o baile da Condessa Elizabeth Bathory. Já fazia alguns meses que o esposo de Elizabeth, o Conde Ferenc Nadasdy, não voltara para o castelo. Ferenc era soldado e costumava ficar longos períodos fora do Castelo Sarvar, na Hungria. Assim, a Condessa sempre ficava encarregada dos assuntos do castelo. E hoje ela organizara um baile, pois Ferenc havia enviado um comunicado à corte que estaria voltando amanhã cedo ao castelo. Mas não é sobre Elizabeth que abordarei aqui, e sim de sua costureira e estilista, chamada Christine.

Christine estava com um lindo vestido branco, seu sedoso cabelo negro muito bem escovado, os olhos castanhos e sua pele branquinha e macia a deixara irresistível esta noite. Mas Christine já estava à espera de alguém, embora já não suportasse mais os convites para companhias de dança. Ela é costureira particular da Condessa, herdou o cargo de sua mãe que também fora costureira da corte. Christine agora observa a obra final de seu grande esforço, o vestido de Elizabeth estava deslumbrante, um dos vestidos mais lindos que já confeccionara. Embora se esperasse que a estilista real estivesse alegre por seu esforço merecido, ela estava com um aperto em seu peito, já era meia noite e quinze e seu amado não comparecera ao baile. Estava triste, caminhava sobre o carpete do salão a sua procura, no entanto, a quinta caminhada pelo baile foi suficiente para deixar-lhe um grande pesar – ele não viera. Henrique Trento, como se chamava, era cavaleiro da corte e estava sempre disposto a servir seus superiores, seu caso com Christine já tinha dois anos. Christine com vinte anos de idade e Henrique com vinte e cinco, estavam completamente apaixonados um pelo outro. Esta noite, Henrique prometera comparecer ao baile, prometeu a Christine que iria dançar a música da noite com ela. Todavia, ele já estava muito atrasado. Christine senta-se, e lembra do que ocorrera algumas horas atrás, na tarde deste mesmo dia.

À margem do lago Muérase, estavam sentados no gramado Christine e Henrique, na proteção de uma gostosa sombra de uma macieira. Faltavam algumas horas para o início do baile e os dois jovens estavam entusiasmados. É aí que Henrique olha para Christine e lhe diz:

- “Estou ansioso para te ver hoje à noite no baile”.

- “Você virá ao baile da Elizabeth?!” – indagou Christine surpreendida e feliz em ouvir aquilo.

- “Sim” – disse Henrique sorrindo – “e quero dançar com você a noite inteira”.

Christine encabulada sorriu. Seu rosto ficara rosadinho com as palavras de Henrique. O cavaleiro então toma Christine em seus braços dizendo que a ama. Christine responde com um beijo.

O lago Muérase ficava próximo ao castelo. Mas ninguém costumava ir até lá. O casal que se beijava agora na margem do lago é interrompido por um grito estrondoso de Elizabeth:

- “Christine!!!!” – a voz da Condessa parecia carregada de muita raiva.

Os dois olham em direção ao castelo, Christine beija seu amado uma última vez e diz em seu ouvido:

- “Espero-te hoje a noite no baile. Compareça, por favor...” – a voz dela era sussurrante e sedutora.

- “Aguarde-me lá, meu doce” – respondeu Henrique.

Então Christine levanta seu vestido e corre pela margem em direção ao castelo, com muita pressa, pois podia se esperar qualquer coisa se tratando da Condessa. O cavaleiro observa seu amor correr para longe, e após a entrada dela no castelo Sarvar, ele vira-se e parte, sabe que irá vê-la deslumbrante esta noite, no baile. Ao chegar ao castelo, Christine estava aturdida.

- “Espere Condessa, já estou a caminho!” – gritara Christine com sua agradável voz quando se aproximou da entrada.

Mas antes que a moça pudesse ultrapassar o portão do pátio, alguém a impede de entrar. Era Victor. Victor é um membro da corte, poderia se casar com qualquer mulher que quisesse, fazia parte da nobreza, possuía grande luxo e propriedades não eram problema para ele. No entanto, apesar de ter montes de damas a seus pés, Victor só tinha olhos para sua ex-namorada de adolescência, Christine.

- “O que quer agora, Victor?” – indagou-lhe Christine.

- “Só quero saber o que estava fazendo no lago” – insinuou Victor, fazendo um olhar de inocente, apesar de já ter certeza que Christine tinha um caso com Henrique.

- “Ora Victor... Não tenho tempo para isso agora... Vamos, deixe-me passar ou a Condessa irá me punir...” - Christine fez cara de nervosa.

- “Está bem, isso é algo que não quero nunca. Qualquer coisa me chame” – Victor beija a mão de Christine – “Estarei aqui para protegê-la minha Christine”.

Indignada, Christine retira sua mão.

- “Que blasfêmia Victor! Já disse que o que ocorreu entre nós é passado... Por favor, tente entender...” – E ao dizer isso, Christine continua sua corrida suspendendo seu vestido em direção ao quarto de Elizabeth.

- “Nos veremos no baile, Christine. Sim, nos veremos” – disse Victor baixinho a si mesmo quando Christine sai em corrida.

A costureira chega ao quarto da Condessa Bathory, e esta não parece estar de bom-humor. Assim que Christine ultrapassa a porta é agarrada pelo cabelo e jogada no chão do quarto sem dó pela Condessa, que sabia muito bem punir alguém quando queria.

- “Desculpe-me a demora, Condessa Bathory.” – suplicou Christine ao se levantar do chão.

Ao observar melhor o quarto, Christine vê que aí haviam mais três empregadas no canto da parede, chorando. Ela percebe que por baixo das unhas dos dedos dos pés e das mãos das criadas estavam fincados pinos de madeira, os dedos estavam sangrando muito, as criadas choravam e não podiam gritar muito alto, senão a Condessa empurrava mais os pinos sob as unhas, uma verdadeira tortura. Ao Christine ver isso, Elizabeth segura-a pelo cabelo e grita em seu ouvido:

- “Eu poderia fazer isso com você, costureira inútil! Mas como preciso de seu serviço agora irei dispensá-la do castigo!”

- “Sim, senhora...” – respondeu Christine assustada.

- “O vestido que você me fizera está com um defeito, conserte-o agora” – diz a Condessa pegando o belíssimo vestido negro com brilhantes que levara tempos para Christine fazer.

O vestido não tinha nada mais que um brilhante fora do lugar, isso Christine poderia consertar num segundo.

- “Claro Condessa, posso fazer isso facilmente”.

- “Bom mesmo, se você não fosse uma costureira tão boa quanto sua mãe iria puni-la pelo seu atraso a meu chamado”.

- “Desculpe Condessa Bathory, não tornará a acontecer” – disse Christine já com sua agulha à mão.

- “O quero pronto logo, pois irei me aprontar para o baile” – dizendo isso Elizabeth sai do quarto.

Christine começa a consertar o vestido, sentada na luxuosa cama da Condessa. Ela observa as servas chorarem com aquele sofrimento, ela tem dó, mas infelizmente não há nada que possa fazer. A Condessa quando está com raiva faz coisas terríveis, e coitado daquele que se opor a suas ações, às vezes ela chega a fazer isso por diversão.

E lá estava ela, deslumbrante pelo baile. A megera desfilava com seu vestido negro, confeccionado por Christine. Sentada sobre um lindo sofá vermelho estava a estilista, triste. Seu amado Henrique não viera, mais uma vez é convidada para dançar por um cavalheiro e pela milésima vez recusa o convite. Christine começou a achar que seria tolice continuar ali no salão e ficar recusando os convites de dança, ela sai para o jardim real. O jardim é simplesmente belo, dividido pelos variados tipos de plantas exóticas, ela está num local com rosas de sortidas cores, próximo à entrada do salão, ali podia ver quem entrava e saia. Chris senta-se num banco de mármore próximo às rosas, observando o movimento do baile. Fica ali a pensar. Pensa por alguns minutos, tristonha. Até seus pensamentos serem interrompidos por um homem que Christine já vira antes, Victor.

- “Vejo que não está animada como todos na festa, senhorita Christine” – ele demonstra elegância.

- “Vá Victor, não quero conversar” – dispensou-o, Christine. Com uma voz que não escondia sua condição decadente.

- “Ora, eu sei por que você está assim, minha Christine”.

- “Já pedi para que não me chamasse assim, Victor!” – ela alterou.

- “Tudo bem. Posso voltar à cordialidade de antes, sem problemas”.

- “Você disse-me que sabe por que estou assim?” – disse Chris voltando-se para o nobre.

- “Sei que você está sentindo falta de alguém” – respondeu ele sentando-se ao lado dela. – “E também posso dizer-lhe que este alguém não virá hoje ao baile”.

- “Como assim? A quem está se referindo, Victor Bathory?!” – indagou Chris quase gritando.

Victor respondeu com uma risadinha sarcástica e irônica.

- “Eu sei de seu caso com o cavaleiro”.

Ao ouvir, Christine não acreditara. Victor se mostrou sempre muito interessado em Christine mesmo depois do namoro há alguns anos, mas este é o primeiro caso de que Victor se intromete assim na sua vida.

- “O que você pensa que está fazendo?” – perguntou Christine com sua sobrancelha ressaltada, insinuante.

- “Nada, eu ainda não fiz nada, Christine”. – respondeu Victor, ainda com seu sorriso irresistível.

Chris suspeitava que Victor escondesse algo, tudo estava muito estranho: seu amado não viera ao baile; Victor se atrasara, pois Christine não o vira antes no castelo; e além disso, ele sabia de toda a verdade sobre ela e Trento. Chris sabia que esta noite não era uma das melhores, era melhor agir com cautela. Apesar de não haver nenhuma restrição que diga que ela, costureira real, não pudesse se casar com um cavaleiro, tudo estava estranho esta noite.

- “Acompanha-me nesta dança?” – Victor convidou-a.

- “Não Victor, não estou com muita vontade de dançar” – disse Christine, de cabeça baixa, ainda triste e agora confusa.

- “Nossa. Que coisa. Você é a primeira dama que me rejeita uma dança”. – Diz ele extrovertido, ele sabia que isso o deixava mais atraente.

- “Você pode ter qualquer uma a seus pés Victor, você já me teve” – replicou Christine olhando-o nos olhos seriamente.

- “Sim, mas eu ainda a quero Christine” – Victor segura as lindas mãos dela.

- “E você também sabe por que não me tem mais” – diz ela virando o rosto e retirando suas mãos das do rapaz.

- “Você sempre teve o que quis de mim Christine, sempre teve” – disse Victor mudando sua expressão.

- “Não Victor! Você sabe que não! Nós dois poderíamos ser felizes, mas você nunca me deixou respirar!” – Christine vira-se para ele lacrimosa.

- “Eu te dei tudo o que uma mulher gosta. Tudo!”

- “Suas jóias, terras e estábulos lotados dos melhores cavalos não significam afeto Victor, você não percebe? Não compreende?” – suas lágrimas desciam sobre as bochechas avermelhadas de tensão – “eu precisava de alguém que me amasse, dando-me seu coração e que me confortasse em meus maiores pesadelos”.

Victor estava atônito, nunca se deparara com tais palavras.

- “Tudo que posso fazer agora é pedir-lhe desculpa, minha Christine” – ele a abraça. Num rápido momento ele tenta roubar-lhe um beijo, mas é impedido por uma evasiva dela.

- “O que está tentando fazer, Victor?” – indaga-lhe ela de olhos encharcados e arregalados.

Sem nada responder, Victor avança sobre Christine e tenta novamente tomar-lhe o beijo. Chris debate-se contra o peito de Victor e consegue empurra-lo. Assustada, levanta-se do banco, suspende seu vestido e corre para dentro do salão. Lá ela se dispersa por entre os convidados, fazendo Victor perdê-la de vista.

Não levanta muita atenção das pessoas, apóia-se na mesa onde está o banquete, suspira por alguns segundos. A visão de Christine percorre todo o salão à procura de Victor, mas não o encontra. Não vale mais a pena permanecer no baile – pensava consigo mesma. Chris sobe as escadas laterais para ir ao seu quarto. Ao abrir a porta, vê que o quarto não está iluminado, ela toma uma das velas que fica nos castiçais do corredor e entra no quarto, trancando a porta. Já dentro do aposento ela acende as velas da cabeceira da cama, que iluminam suavemente o local, apaga a que trouxera do corredor e senta-se à penteadeira para se preparar para dormir.

Olha-se fixamente. A luz suave emanada pelas chamas que consumiam a cera deixa Christine com uma linda aparência. Ela escova seus cabelos, pensando em qual seria o motivo de Henrique não cumprir com o prometido. Daria tudo para que seu amante estivesse ali agora. Enquanto ela se olhava no espelho, percebe alguém se aproximar ao seu lado e tocar seus ombros, surpresa ela reconhece as mãos de Victor. Olhando-se ainda ao espelho ela escancara os olhos castanhos, arrepiando-se por completa com a presença do sujeito – como conseguiu aqui entrar? – pensava.

- “Sua pele, tão doce...” – sussurrava Victor, deslizando a mão no rosto de Christine. – “você goza de grandiosa beleza”.

- “Victor, retire-se”. – Christine foi branda.

Mas parecia que Victor não a ouvira. Ele continuou ali, hipnotizado por Chris.
- “Victor, saia!” – desta vez Christine interveio, levantando-se.

O nobre estava virado de costas, observando um quadro com a imagem de Christine. E na mesma posição em que se encontrava pôs-se a falar:

- “Você realmente o ama, Christine?”

- “Ora, Victor. Não quero falar disso”.

- “Só sairei daqui com a resposta!” – o Sr. Bathory alterou, voltando-se para Christine.

Por um instante o silêncio reinou entre os dois que se entreolhavam. Christine surpreendida pelo modo de agir de Victor, respondeu cinicamente:

- “E se eu o amasse?”

Aquilo atingiu Victor fortemente, percebia-se que pensamentos invadiam sua mente.

- “Então era ele que estava com você no parque, Christine?” – ele agora falava como se tivesse muita raiva.

Ao escutar isso, o coração de Chris acelera. Ela não estava compreendendo, mas se lembrava bem do que ocorrera há quase três anos atrás.

- “Do que está falando, Sr. Bathory?” – fingiu-se cética.

Victor silenciou, abaixou a cabeça e pensativo permaneceu. Enquanto Chris, amedrontada, caminhou de forma amena até a porta, estava com medo de permanecer no quarto com Victor. Antes que pudesse tocar a maçaneta, ela presencia o nobre ser vítima de pensamentos que lhe viam à mente.

- “Eu te amei, Christine” – ele balbuciava – “você pode pensar que não, mas apesar de tudo eu te amei!”

Christine ficou calada, aos poucos se aproximando da maçaneta para sua fuga.

- “Apesar de tudo, eu te amei!” – Victor já derramava lágrimas – “mas você só se interessou por minhas riquezas, era isso que você queria de mim, não meu amor!”

- “Não é verdade, Victor”.

- “Não? E agora se atreveria a negar o que aconteceu naquela noite, no parque?”

- “Esqueça, Victor!” – e ao gritar, Christine abre a porta com rapidez e corre pelo corredor, para os fundos do castelo. Victor a persegue.

Descem alguns degraus e chegam até a saída sul do castelo. Christine corre em direção às rosas vermelhas. Seu lindo vestido é danificado pelos espinhos, sofre alguns cortes que fazem extravasar seu sangue rubro que se torna chamativo na pele nívea. O nobre Bathory ainda continua em seu encalço, rugindo como uma fera. O jardim de rosas parecia não ter fim e após algum tempo de perseguição, Victor alcança Christine segurando-a pelo seu braço. Voltando-se para ele, Chris suplica que a deixe em paz, mas tudo que consegue é uma pancada bem na testa que a faz desmaiar instantaneamente.

*

Christine acordou. Sua cabeça estava atordoada, doía. Nos poucos segundos de transição entre a vertigem e a consciência ela se descobre amarrada a uma cadeira de madeira, desconfortável. Seus pés, suas mãos, inclusive seus olhos, estavam amarrotados. Estava mergulhada em completa escuridão. Seu vestido branco de baile estava sujo e com alguns rasgões nas dobras dos ombros e cotovelos. Voltando à sua sanidade, ela se desespera tentando inutilmente se soltar da cadeira, mas qualquer esforço dela é em vão, sua simplória força de moça de vinte anos não é suficiente para desatar os nós em seus braços que arranhavam seus pulsos de tão fortes que estavam.

- “Socorro!” – gritava histérica – “ajudem-me!”.

Mas nada... Ninguém respondia suas súplicas. Ela chora, encharcando o pano que envolve seus lindos olhos. Até ouvir a voz de alguém se aproximando dela.

- “Não se preocupe, Chris... Estou aqui”. – dizia um sujeito de cabelos pretos ondulados.

Ele retira a faixa que cobria os olhos de Christine, o rosto da moça estava totalmente manchado da maquiagem borrada. Ele enxuga as lagrimas dela com um fino lenço branco. O homem tinha por volta de vinte e sete anos de idade, era branco e estava muito bem vestido, assim como Christine que também estava vestida a caráter para o baile que houvera há pouco.

- “O que você quer, Victor?” – indagou aflita.

- “Nada, minha doce, nada demais.” – respondeu Victor calmamente enquanto segurava a única vela que iluminava a sala onde estavam.

Victor aproxima-se de um castiçal com muitas velas e acende cada uma. Logo o local onde estavam é iluminado pelas chamas em conjunto das velas do castiçal, que estava sobre uma mesa velha. Christine ainda tenta se soltar, mas como antes seu esforço é inútil. Ela observa o local, o assoalho é de madeira, já um tanto desgastada, o aposento que se encontra aparenta ser uma sala de estar, onde tinha uma lareira sem chama e móveis deteriorados.

- “Por que me trouxe aqui?” – ela indagou com voz lamurienta.

- “Só quero te fazer relembrar da noite, no parque. Afinal, sua tola cabecinha já esquecera de tudo que fez a mim!” – respondeu Victor com olhar ameaçador.

Chris o encara nos olhos, tentando descobrir onde este maldito louco pretendia chegar.

- “Enquanto você não chegava a seu quarto, eu estive dando algumas bisbilhotadas por lá, e me surpreendi com o que achei” – ele sorria.

- “Não sei como conseguiu entrar ali, mas seja o que for que tenha pegado devolva-me” – Christine estava séria.

- “Foi muito fácil entrar em seu pequeno refúgio, afinal, existia uma chave reserva por trás do terceiro quadro do corredor, então me senti à vontade de utilizá-la”.

- “Como soube da chave?”

- “Eu tomei conhecimento de seus segredos Christine, pelo menos todos que você registrou até ontem à noite” – ele ainda continuava sorridente e sarcástico.

A moça ficou aterrorizada, um gélido calafrio lhe correu o corpo. Ele não pode ter conseguido isso, não isso! – pensava.

- “Ah! Você deve estar se perguntando como consegui acha-lo” – ele riu – “Não foi tão difícil encontra-lo já que debaixo da cama foi o primeiro lugar que procurei e só precisei de alguns segundos para encontrar a chave do cadeado do baú dentro de seu porta-jóias”.

Christine ficou surpresa, ele realmente o encontrou. Num instante abaixou a cabeça, sua mente estava em enorme confusão. Resistindo à notícia, Chris levanta o rosto:

- “Diga-me, Victor, há quanto tempo vem bisbilhotando meu quarto?” – ela indagou com os olhos retraídos.

- “Há três dias, querida Christine, mas nunca tive tempo suficiente para saber o que me interessa” – continuou – “Naquele dia chuvoso, em que você perdeu a chave no terraço da frente do castelo, eu vi quando você foi até o quadro dos cavalos alados, olhou em volta, e quando pensou que estava segura, eu a vi apanhar a chave, por trás do quadro”.

A estilista estava boquiaberta. Victor prosseguiu:

- “Claro, no mesmo dia o jardineiro encontrou e você não precisou utilizar mais a chave reserva, foi aí que achei interessante saber o que você escondia no seu quarto, minha linda Christine, afinal, já tínhamos sido namorados e um pouco de intimidade, mesmo depois da relação, não seria lá um problema, não acha?”

- “Você está ficando louco se acha que isso me fará voltar para você...” – Christine rangeu.

- “Sei que vai querer voltar Christine, após esta noite vai precisar de alguém que a conforte. Não há alguém melhor do que eu, porque eu a amo!”

- “Acabe logo com essa tortura, aonde quer chegar com isso?”

- “Ora, vamos por partes, minha linda Christine” – disse Victor tocando suave o queixo de Christine, que recuou a cabeça para tentar evitar o contato.

Victor caminha até uma região escura da sala. De lá, retorna com um pequeno baú de madeira, verde e adornado por rosas talhadas em ouro; carregava o objeto com as duas mãos. Ao ver isso, Christine assume um ar de pavor.

- “Maldito! Você violou minha privacidade!” – grita Chris quase se levantando da cadeira, senão estivesse antes presa.

- “Ora, não se preocupe, minha linda estilista” – dialogava Victor manuseando o pequeno baú – “como disse antes, não tive tempo de ler o que realmente me interessa, felizmente, este será um ótimo momento para usufruir disto, pois assim também a farei lembrar do dia 23 de março de três anos atrás”.

Ao dizer tal coisa, o nobre retira do bolso uma pequena chave dourada, encaixa-a na pequena fechadura do baú, que tem formato de uma rosa ornamentada, e gira, abrindo, assim, o objeto.

O interior do baú é revestido por uma textura vermelha, macia. Victor retira de dentro três montes de folhetos, atados e divididos por capas de couro, cada capa tem a especificação de uma data.

- “Vejamos...” – dizia Victor pondo o baú aberto sobre a mesa próxima, e examinando os folhetos.

Na capa do primeiro estava escrito: “1571 – Christine Griedith”; na capa do segundo: “1574 - Christine Griedith”; e no terceiro: “1576 - Christine Griedith”.

- “Hum... Qual devo ler primeiro?” – indagou fazendo-se de solerte e erguendo os três maços de folhetos.

Christine silenciara, ali estavam todas as anotações que fizera durante os anos, desde que tinha doze anos de idade. Isso era uma grande invasão em seus segredos mais íntimos, suas anotações sempre serviram para ela expor o que sentia.

- “Se você não quer opinar... eu mesmo escolho...” – Victor sorriu e pegou as anotações dos doze anos de idade de Chris, do ano de 1571.

Ele abre aleatoriamente a caderneta e põe-se a ler:

13 de Julho de 1572

“Hoje foi um dia turbulento, minha mãe e eu tivemos que trabalhar em dobro, os superiores exigiram que as roupas estivessem prontas para hoje à tarde. Com pressa minha mãe perfurou os dedos com a agulha várias vezes, agora seu dedo está inchado, roxo e dolorido; minha mãe, eu a amo tanto. Quando terminei de ajuda-la, a Condessa Elizabeth Bathory me chamou para que limpasse o quarto dela, no começo eu não tinha entendido, mas depois que limpei o quarto fui dizer à Condessa que meu serviço estava feito. Vi-a pela varanda do quarto, ela estava no pátio do castelo, com o conde Nadasdy. Entretanto, o que mais me surpreendeu foi o que os dois faziam. Estava nevando e fazia muito frio, avistei ao longe as moças que faziam a limpeza do quarto da Condessa, elas estavam despidas na neve, enquanto a própria Condessa e o conde Nadasdy divertiam-se jogando água nas criadas, elas gritavam muito, tremiam de frio. Fiquei apavorada com a diversão dos dois e saí do quarto correndo, ainda bem que já havia deixado tudo muito bem arrumado. Mamãe disse-me que não deixaria a Condessa fazer algo assim comigo e me deu boa noite antes de fechar a porta do quarto. Desta vez ela deixou a vela acesa. Agora vou me deitar e dormir, amanhã tenho mais serviços a fazer”.

- “Nossa... A Elizabeth sabe que você escreve sobre as suas práticas de punição?” – indagou Victor.

- “Ela não vai precisar saber” – respondeu Christine austera, já estava enraivecida com Bathory.

Victor percorreu algumas outras páginas, ficou pasmado com os relatos de punição da Condessa. Leu mais um texto, onde havia mais uma passagem destas:

22 de Dezembro de 1572

“(...)
Desta vez, não houve realmente um motivo para punir a Carllota e a Joana, mas a Condessa o quis fazer, levou-as para fora do castelo. Eu não quis ver qual seria o castigo, mas pelos rumores que ouvi, elas foram despidas e cobertas com mel, muitos insetos a encobriram, picando-as. Gritando por ajuda elas correram para dentro da mata e não voltaram mais.
(...)”

- “Você mesmo pode ver que isso é doentio!” – disse Christine, amargurada.

- “Nós podemos fazer isso com os criados que não fazem um bom serviço!” – respondeu Victor.

- “Eu sei. Vocês podem castigar, mas o que a Elizabeth faz já é de tamanha extravagância!”

- “Não se preocupe Christine, eu nunca deixarei que Elizabeth faça isso a você”.

- “Cale-se...” – replicou Christine cedendo a face.

- “Hum... Vejamos o que escrevera em seus 15 aninhos, Christine...” – Victor guardara as anotações de 1571 e tomou nas mãos as de 1574.

Ele folheia os manuscritos, e abrindo num ponto em que acha interessante põe-se novamente a ler.

15 de Janeiro de 1574

“Hoje a noite está fria, tão fria que estou escrevendo bem próximo à lareira. A chama escarlate cintila por entre as paredes de concreto. Bem, tenho algo a dizer sobre hoje, conheci um garoto chamado Victor Bathory, primo da Condessa. Ele mesmo veio até mim para me conhecer, havia chegado à Hungria há pouco tempo. Viajara com seu pai quando ainda era criança, como tinha me contado. Gostei dele, falava como uma modesta pessoa sabendo que era um nobre da corte da família Bathory. Assim, conversamos a tarde inteira e nos divertimos vendo as estrelas, ainda pouco. Realmente adorei tê-lo conhecido. Agora deixo de escrever, pois estou com muito sono e amanhã tenho de encontrar o Victor após os afazeres.”

Victor sorriu, mas nada proferiu. Christine continuava de cabeça baixa ouvindo suas anotações serem lidas por Victor. Sem nada dizer (ele se mostrava agora muito sério), Victor toma as anotações dos 17 anos de Christine, quando eles começaram o namoro.

- “Vejamos agora...” – sussurrou ele.

23 de Outubro de 1576

“Agora já passam das três da madrugada e ainda não consegui fechar meus olhos para dormir. Não é por causa do frio, estou bem coberta com minha cocha quentinha e usando a mesma para me esconder dela, Elizabeth Bathory. Estou chocada com o que vi, espero que ela não tenha percebido nada. Eu apenas estava lavando o chão do salão junto a algumas criadas, quis fazer um bom trabalho e decidi lavar o assoalho dos corredores, cozinhas e banheiros. Ao passar frente à porta do quarto da Condessa, pensei em fazer algo mais para agradar em meu serviço e assim ser vista com bons olhos. Pensei em lavar o chão do quarto da Elizabeth, pus-me a entrar e comecei meu serviço lavando todo o piso: debaixo da cama, sob as cortinas e móveis. Foi então que descobri algo por baixo de uma das tapeçarias do quarto, era um alçapão. Não estava trancado, então levantei a porta da passagem e assim adentrei naquele local que apresentava uma escada para descer. Curiosa àquilo, desci os degraus de pedra lapidada, gélidos e escuros. Ao fim da pequena escadaria encontrei uma sala, onde não havia móveis, nem mesmo piso além da própria rocha escavada. No centro do aposento, uma espécie de banheira esculpida no mármore adornava o local, dentro da banheira estava a Condessa Bathory vestida com apenas um tecido púrpura, finíssimo. A banheira estava vazia, mas a própria magnânima cuidou de preenchê-la, ela arremessou o tecido que enroupava ficando totalmente despida, ela tinha um belo corpo. Abatida, escondi-me perto da escada e observei de longe o que ela estava para fazer. Eu não havia percebido a princípio, mas estavam acobertadas quatro criadas com um longo tecido preto, próximas à banheira, as quatro estavam desacordadas. Elizabeth as posicionou em quatro extremidades da banheira, que estavam demarcadas por cabeças de dragoas com suas bocarras voltadas para dentro da banheira. Depois de posicionadas, Elizabeth retorna para dentro do local onde estivera antes. É aí que assisto a Condessa vagarosamente cortar o pescoço das quatro moças, utilizando um tipo de anel que aparentava uma sinuosa presa. As criadas morrem ali mesmo com o sangue jorrando. E assim que a banheira está cheia com o sangue das moças, a Condessa inicia sua ablução. Não agüentei ficar mais um segundo dentro daquele aposento de horror. Corri para fora e deixei tudo como estava antes.”

Ao ler tal escrito, Victor parece impressionado. Nunca esperou de sua prima algo assim, e não havia motivos para suspeitar se Christine mentia ou não, afinal, aquele era seu diário pessoal.

- “Eu avisei, Victor!” – diz a costureira com voz estridente.

- “Mas isso não me importa, Chris!” – grita Victor – “o que eu realmente quero saber é sobre a noite no parque, quero saber o que você tem a dizer sobre o que você mesma fez”.

- “Ande, vá em frente”.

Victor folheia e folheia, até achar.

23 de março de 1577

“Desta vez me atrasei, mas eu não tenho culpa! Não estava em condições de escrever algumas horas atrás. São quatro horas da madrugada, e nem mesmo penso em dormir. A noite foi muito perturbadora, hoje meu namoro com o Victor chegou ao fim. Eu estava na cabana de verão de Victor, esperava ele retornar. Estava preparando um delicioso jantar para ele, até que precisei de alguns temperos, procurei no armário da dispensa mas nada achei. Lembrei-me então que embaixo, no porão, havia algumas reservas de alimento, fui até lá ver se encontrava tempero para o ensopado que estava aprontando. Ao chegar, procurei por entre os caixotes de comida reserva algum tempero, no entanto não encontrei. Procurando entre os caixotes encontrei um cujo não havia comida, mas sim vários documentos de propriedades. Peguei alguns e os levei para cima, para saber do que se tratavam. Sentada na sala, ao acompanhamento da chama da luminária, investiguei tais documentos, surpreendendo-me a cada um que lia. Aquelas eram propriedades de pessoas que já haviam falecido: fazendas, moradias, animais. Estas pessoas haviam deixado estas propriedades como herança para descendentes, mas o que me comoveu foi que Victor era o dono de cada uma delas! O Victor era na verdade um ladrão de heranças! Todas as suas riquezas na verdade não passavam de propriedades dedicadas à outras pessoas, mas mesmo assim, como ele as obtinha? Eu estava desnorteada. Neste momento minhas investigações são interrompidas por alguém que bate à porta com muito alvoroço. Rapidamente guardo o caixote com as folhas de documento e corro para atender às batidas na porta, era Henrique um dos guardas da realeza, o conheci há três dias. Ele me avisou que Victor estava bêbado vindo para casa junto com um sujeito não muito amigável e disse também que ouviu os dois dialogarem sobre mim, que iriam me fazer algum mal. Alarmada, saio em correria com Henrique, mas assim que saímos da cabana damos de cara com a dupla, totalmente foras de si, sob efeito da cerva. “Christine! Christine!” – eu ouvia Victor clamar por mim com muito rancor, seu ódio aumentou ainda mais quando me viu com Henrique. O guarda real puxou-me pelo pulso e corremos em direção contrária. Para onde? Nem mesmo sabíamos. Corremos numa fuga implacável por entre as árvores do bosque. Victor e seu capanga estavam em nosso encalço, até que chegamos a um parque infantil, bem no meio do bosque, numa clareira. Henrique e eu escondemo-nos detrás do escorregador. Ao longe avistamos Victor e seu companheiro separarem-se para vasculhar o local por nós. Quase gritei ao ver que o capanga de Victor empunhava uma arma letal, um berrante. Henrique decide ir combatê-lo, tentei impedir, pois era muito perigoso, mas nada adiantou. Ele levantou-se e atacou o sujeito pelas costas, os dois rojaram-se pelo chão, atracando-se, a espada do guarda cai na terra. Até que o sujeito fica sobre Henrique apontando o berrante para ele, ao assistir isto eu não agüentei e me levantei para socorrer Henrique, empunho a espada que estava caída ao chão e encravo nas costas do sujeito. Eu o havia matado. Comecei a chorar, mas meus prantos são interrompidos por Henrique que me advertiu que Victor estava voltando para o local onde estávamos. Antes que ele pudesse chegar e nos encontrar ali, empunhei novamente a espada e lapidei no concreto do escorregador uma mensagem para Victor quando ali chegasse, para que não viesse mais a meu encontro. Depois disto então, volto chorando ao ombro de Henrique que me fora protetor naquela hora. Se não fosse por ele, Victor e seu amigo poderiam ter me maltratado no estado que se encontravam. A esta altura Victor já deve ter visto a mensagem e o corpo de seu amigo, assassinado por minhas mãos.”

Lágrimas tocaram o papel do escrito de Christine, Victor estava lamuriando. “Não, não” – dizia a si próprio – “você havia descoberto meus negócios sujos”.

- “Eu não tive coragem de te dizer isso, não queria me meter em tudo isso”. – Christine também chorava.

- “Mas você me deixou por ele. Foi por causa disto, Christine?”

- “Isto foi o fator mais forte, no entanto, o fato de que você voltasse bêbado outra vez pra mim também serviu de álibi”.

*

A dor em sua cabeça era enorme, esta pontada que vinha e voltava incessantemente. Henrique podia sentir a rígida madeira do caixão cujo estava trancafiado. Seus olhos já estavam acostumados ao escuro, ele podia enxergar pouco mais que um palmo à sua frente. Dando-se conta de onde estava, Trento não hesita em vociferar por ajuda, em questão de segundos raciocinou que o ar dentro do caixão extinguir-se-ia logo.

Naquela mesma moradia, na sala de visitas, Christine e Victor que discutiam algo pessoal escutam os clamores bestiais de Henrique. Christine que estava ainda amarrada à cadeira impera:

- “Victor! O que fez a ele?! Tire-me daqui já!”

Victor não fazia nada mais que lacrimejar. Sem pressa desamarra Christine, libertando-a do cativeiro que a mantinha. Inconstante, Christine tenta seguir os berros de seu amado, voltando-se toda vez atrás para encarar Victor que chorava sentado à cadeira onde aprisionara a costureira.

Os gritos de Henrique levam Christine ao porão do local, o qual quase não era iluminado, obstante uma luz azulada que irradiava de uma pequena abertura no sopé do teto do porão. Ela ouve os gritos. Henrique percebe que há alguém sobre o piso em que estava enterrado, mas também percebe que logo perderá o pouco ar que ali dentro restava. Christine estava nervosa.

- “Onde estais? Onde estais?” – sua voz era suplicante.

No entanto, os gritos haviam cessado. Christine derrama-se em prantos, ajoelhada ao assoalho, suas palavras são apenas deprimidos “nãos”, suas mãos alvas batem contra o assoalho de madeira, cujo seu amado estava sob. Ela escuta alguém falar consigo.

- “Tome, Christine”. – disse Victor que chegou até o porão.

- “Eu te odeio Victor”. – o sussurro de Christine quase não foi ouvido, mas por sua expressão o sentimento que demonstrou era de tamanho ódio.

O nobre entrega-lhe uma picareta, ele joga a ferramenta à frente de Christine. E antes que saísse, Victor diz:

- “Não precisará me ver outra vez. Seus escritos estão sobre a cadeira na sala, irei embora para o exterior, não nos veremos mais. Adeus, Christine.” – e então ele sai de cabeça baixa, sem olhar para trás.

Christine pouco se importava com aquele louco agora. Ela segura a pesada picareta e começa a abrir o assoalho, arrancando as tiras de madeira que o cobriam. Henrique querido, por favor, resista – dizia ela a si mesma em seus pensamentos – não me deixe. Chris usava toda sua força, a picareta é pesada e ela quase não tem controle quando a desce sobre a madeira do piso. Descobriu isso tarde demais e quando já estava por volta da décima terceira tentativa de encontrar onde Henrique estava. Ao desferir o golpe contra o chão, ela nota que britou algo. E ao reerguer a picareta viu que esta estava suja de sangue. Assombrou-se, seu olhar era de espantoso terror ao fitar a ferramenta que erguia, Christine atingiu seu amado sem se dar conta. Rapidamente retira o piso da região e vê um caixão, do qual Victor usara para enterrar vivo o cavaleiro. E destampando-o observa seu Henrique com uma enorme abertura no crânio o qual ela mesma fora autora. Entretanto, tudo indicava que ele já havia perdido a consciência pela falta de ar.

- “Não!” – o grito de Chris podia ser ouvido a distância.

Ela abraça seu amante, com a esperança que ele voltasse. Henrique foi seu guardião desde o começo, e ela o retribuiu deste modo. Estava enojada de si. Christine chorou, até que suas lágrimas cessaram e ela levantou-se com um olhar mórbido para seu amor morto. Chris fecha o caixão, põe as tábuas novamente ao assoalho. De lá sai cambaleante. Chega até a sala onde estava em cativeiro pelo alucinado nobre. Toma o baú de suas anotações no braço e sai daquela casa onde aconteceram verdadeiros horrores.

Ao afastar-se, Christine já estava perto do castelo Sarvar. Era madrugada e as portas já estavam fechadas. Ela vê acima, no local do guarda noturno que este estava dormindo, ela sorri, apesar de todo pesar que trazia consigo. A costureira real coloca seu baú diante do portão de entrada, o baú de seus escritos com todos os atos da Condessa Elizabeth e seus segredos de adolescência. Chris segue para algum local próximo ao castelo, o lago Muérase. O luar refletia nas águas do lago tornando-o um espetáculo de luz, lindo de deslumbrar. Christine agacha-se à margem, viu o reflexo de seu vestido branco pútrido e seu rosto inexpressível e manchado. Ela retira dos seios alguns folhetos enrolados, eram seus escritos de 23 de março de 1577. Abre-os, mas nem mesmo pensa em lê-los, e por fim arremessa-os ao vento que leva os manuscritos para o meio do lago, onde estes afundam suavemente. Christine mantinha sua expressão nula. Avista ao lado do lago um bosque, ela reconhece aquela formação de árvores e vai naquela direção. Caminha por entre as folhas caídas, seu vestido rasgado nas pontas carrega algumas. O bosque escuro logo revela uma clareira, lá está um parque com gangorras, escorregadores e balanços. Ao se aproximar de um dos brinquedos, um escorregador, lê uma mensagem grafada no brinquedo: “Victor, esqueça-me. Você trouxe meus piores pesadelos à realidade”. Sim, ela se lembra desta mensagem.

Mas o percurso de Christine não havia acabado. Ela segue para fora da clareira do parque, entrando novamente no sombrio bosque. Caminha outra vez por entre as árvores, apoiando-se em algumas no caminho quando algumas memórias fortes lhe vêm à mente. Até que a moça chega ao fim do bosque, marcado por um trecho de terra que se prolonga à frente, acabando num abismo. Chris vai até lá, fica bem na ponta e vislumbra a paisagem natural abaixo, a rocha que a sustentava racha-se e desprende-se. Christine desaparece na névoa debaixo do abismo.



Escrito por Julio Capistrano || 7:57 PM